Mudanças na Legislação do Aborto em Menores de Idade
O Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 3/2025, que busca revogar a resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) sobre o aborto legal em crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, está ganhando força na Câmara dos Deputados. Recentemente, o deputado federal Luiz Gastão (PSD-CE), que atua como relator da proposta, emitiu um parecer favorável à derrubada da Resolução nº 258/2024, que já recebeu aprovações em comissões importantes, incluindo as de Previdência, Assistência Social e Infância.
No seu parecer, Gastão argumenta que menores de 16 anos não possuem a autonomia necessária para decidir sobre a interrupção de uma gravidez, sugerindo que o aborto só deveria ocorrer com a apresentação de um boletim de ocorrência ou com autorização judicial. “A omissão de autorização judicial, na minha visão, é uma afronta ao direito do nascituro de acesso ao Poder Judiciário”, declarou o relator em seu documento.
Por outro lado, o Conanda defende que nem mesmo os responsáveis legais da vítima precisam ser notificados quando há suspeita de violência sexual, especialmente se o caso ocorrer dentro do ambiente familiar. Gastão, no entanto, critica essa abordagem, questionando a falta de um limite temporal para a realização do aborto, ressaltando que a ausência desse critério poderia permitir abortos em gestações próximas das 40 semanas.
A resolução em vigor estabelece que a gravidez não deve ser um impedimento para o aborto, o qual deve ser feito sem necessidade de notificação ao conselho tutelar. Desde fevereiro, o projeto estava estagnado, mas voltou a ganhar destaque no final do mês passado, quando a deputada Chris Tonietto (PL-RJ) e outros parlamentares pediram urgência na votação do texto. Se aprovada, a urgência permitiria que a proposta seguisse diretamente para votação em Plenário, sem mais delongas nas comissões.
Críticas à Resolução do Conanda
No despacho enviado ao relator, um grupo de deputados argumenta que o Conanda estaria desconsiderando o “poder familiar” e fazendo interpretações inadequadas sobre o direito à objeção de consciência em relação ao aborto. Eles ressaltam que a resolução confere excesso de poder decisório a crianças e adolescentes, desconsiderando o que diz a legislação civil. Em consonância com grupos pró-vida, eles afirmam que a norma do conselho viola o direito à vida e à integridade física do feto.
Os deputados também destacam que o aborto não deve ser considerado um direito, conforme afirmado pela norma, uma vez que a Constituição Federal protege o direito à vida desde a concepção. Entre os apoiadores do PDL estão figuras proeminentes como Eduardo Bolsonaro (PL-SP), Bia Kicis (PL-DF) e Chris Tonietto (PL-RJ), além de Marco Feliciano (PL-SP) e Zé Trovão (PL-SC), com o apoio de membros de outras siglas.
Normas Atuais e Implicações
A resolução atualmente em vigor estabelece que, ao realizar um aborto, as equipes de saúde devem seguir diretrizes internacionais, como aquelas da Organização Mundial da Saúde (OMS), assegurando a segurança da vítima durante o procedimento. O artigo 33 da resolução determina que nenhuma exigência deve comprometer o direito fundamental à saúde e à liberdade da criança ou adolescente.
O Conanda é o principal organismo federal responsável por essa política e está vinculado ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Desde o ano passado, o tema gera controvérsias entre os conselheiros. Embora a resolução tenha sido aprovada pela maioria, houve tentativas de revisão por representantes do governo federal que se opõem ao texto.
A campanha Criança Não é Mãe, em nota técnica enviada à Agência Brasil, alerta que o PDL 03/2025 representa um retrocesso significativo em relação à proteção das crianças no Brasil, ao eliminar a norma que oferece um atendimento humanizado às crianças vítimas de violência sexual. A campanha enfatiza que os protocolos definidos pela resolução do Conanda já são aplicados com sucesso em diversos países e priorizam o cuidado com as vítimas. Dados alarmantes indicam que, entre 2018 e 2023, uma menina entre 10 e 19 anos morria semanalmente no Brasil devido a complicações relacionadas à gestação.
Além disso, a OMS destaca que complicações durante a gravidez e o parto são a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 19 anos globalmente. A resolução também enfatiza que a gravidez na infância e adolescência acarreta sérias consequências para o futuro das jovens, limitando suas oportunidades educacionais e sociais. Estudos mostram que a evasão escolar entre adolescentes mães é drasticamente superior àquela entre suas pares sem filhos.
Dados Alarmantes Sobre Gravidez Precoce
Um estudo recente da Associação de Obstetrícia de Rondônia revelou que cerca de 14 mil meninas entre 10 e 14 anos deram à luz no Brasil em 2023, enquanto apenas 154 acessaram o aborto legal. As estatísticas sobre violência sexual também são preocupantes: 67% dos 69.418 casos de estupro registrados entre 2015 e 2019 tiveram como vítimas meninas nessa faixa etária. Na maioria das vezes, os agressores eram pessoas conhecidas das vítimas.