A Força Feminina na Coleta do Murumuru
Com passos decididos, um grupo de mulheres atravessa as trilhas da floresta, conhecendo cada canto e cada momento do processo de coleta do murumuru. Protegidas por lenços e chapéus, essas extrativistas estão sempre atentas ao chão para encontrar os pequenos coquinhos caídos das palmeiras, um recurso valioso que simboliza esperança e sustento para muitas famílias. O murumuru, desse caroço, é o segredo do óleo que já conquistou as prateleiras das principais indústrias de cosméticos do Brasil, levando o nome do Acre para além de suas fronteiras.
Essas mulheres são protagonistas de uma história de resistência e empoderamento. Em Cruzeiro do Sul, elas se destacam na coleta desses frutos, garantindo uma renda digna e contribuindo para o sustento de centenas de lares. Raimunda Gomes, uma aposentada que não abandonou a lida, compartilha sua paixão pela coleta: “Meus filhos dizem que não preciso mais trabalhar com isso, mas eu gosto. Tem muita mulher junto, e a gente se ajuda, conversa, se fortalece”, revela enquanto manuseia os coquinhos recém-recolhidos. Essa união é a força motriz que as impulsiona.
Raimunda também expressa sua preocupação com o meio ambiente. “Não é certo colocar fogo. A gente precisa disso aqui. Quem queima é quem acha que não precisa”, afirma, enfatizando a necessidade de preservar a floresta que tanto lhes dá.
Tradicionalismo e Inovação: O Ciclo do Murumuru
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A trajetória de Maria Lisbete da Páscoa reflete a união entre tradição e modernidade. Desde jovem, ela tem se dedicado ao trabalho com coquinhos, começando no Pará, antes de se mudar para o Acre. Ao lado da filha, Antônia Cauane, elas se tornaram uma dupla imbatível, alcançando a marca de sete sacas em um único dia. A cooperação com a Cooperativa dos Produtores de Agricultura Familiar e Economia Solidária de Nova Cintra (Coopercintra) foi fundamental para transformar suas colheitas em manteiga de murumuru, um produto de qualidade que abastece marcas reconhecidas como a Natura.
“Nós que carregamos. Os meus homens somos nós mesmas”, brinca Lisbete, que ensinou sua filha a coletar, mesmo quando ela tinha medo de ir à mata. “Ela chorava querendo ir pra mata, mas agora vem com seu balde.” A preocupação de Lisbete com a destruição ambiental é evidente: “Chorei quando vi as palhas tudo pretas de queimada. Estavam queimando onde a gente tira o pão de cada dia”, desabafa.
Mulheres como Maria Elice da Silva, que possui 59 anos e uma vasta experiência em coleta, expressam a importância desse trabalho não apenas para sustento, mas também para sua autonomia e felicidade. “É gratificante. Às vezes falta dinheiro, mas vem o dia da coleta e traz alegria”, conta, destacando o valor das interações e das risadas compartilhadas durante as atividades na floresta.
Estratégias de Fortalecimento e Sustentabilidade
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Com o murumuru como a principal oleaginosa coletada no estado, a Coopercintra não só garante renda, mas também estrutura para expandir seus negócios. O papel da Fundação de Tecnologia do Acre (Funtac) é crucial nesse processo. Além de disponibilizar o espaço onde funciona a miniusina da cooperativa, a fundação investe em capacitações para mulheres e jovens, promovendo um futuro sustentável e valorizando saberes tradicionais.
A diretora técnica da Funtac, Suelem Farias, esclarece: “Daqui uns dias o futuro realmente são essas pessoas. Então, tentamos fazer com que esses jovens tenham uma fixação na zona rural.” A Funtac também busca parcerias e recursos, como o REM KfW, para fortalecer a bioeconomia local. As capacitações são organizadas separadamente para jovens e mulheres, respeitando as especificidades de cada grupo.
A importância do cuidado feminino é ressaltada por Suelem: “Sabemos que a mulher é mais cuidadosa na hora de embalar e etiquetar, é ela que faz toda essa parte de maior detalhamento.” Essa sensibilidade se reflete na consciência ecológica que permeia a cadeia extrativista, onde o respeito e a preservação do meio ambiente são primordiais.
Inovações que Transformam a Realidade
Recentemente, o governo do Acre fez história ao implementar a subvenção do murumuru diretamente na conta dos extrativistas, uma mudança que trouxe dignidade e segurança ao processo. Essa nova metodologia, estabelecida pelo Decreto nº 1.564/2024, foi resultado da determinação do governador Gladson Camelí e da Secretaria de Estado de Agricultura (Seagri).
O secretário de Agricultura, José Luis Tchê, expressa sua satisfação com a mudança: “Criamos a divisão do subsídio para atender exclusivamente os extrativistas, porque antes ela era fundida a outras áreas.” Ele enfatiza que pagamentos eram frequentemente atrasados devido a erros burocráticos, mas agora a solução é direta e rápida, em colaboração com o Banco do Brasil.
Em um momento em que a bioeconomia se afirma como uma estratégia essencial para o Brasil, o murumuru do Acre evidencia a força presente em cada semente e a sabedoria coletiva das mulheres que garantem a continuidade de um ciclo sustentável. A floresta é um bem precioso, e cabe a elas, as guardiãs de suas raízes, assegurar que esse legado seja repassado para as futuras gerações, com coragem e compromisso.