Modelo Estatal Para o Controle de Bebidas Alcoólicas
A crise de intoxicações por metanol que afeta o Brasil é consequência de uma regulação considerada “hiper liberal”, resultante de uma tradição econômica que, por séculos, esteve centrada na produção de derivados da cana-de-açúcar, como o açúcar e a aguardente. Essa avaliação provém do historiador Henrique Carneiro, professor da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Laboratório de Estudos Históricos das Drogas e da Alimentação (Lehda).
Carneiro afirma que a cultura do álcool no Brasil, que ele classifica como leniente e atrelada ao conceito de “sacarocracia” de Gilberto Freyre, originou um ambiente sem quaisquer restrições significativas. “Nunca houve um controle efetivo”, destaca o historiador, que também é membro da Alcohol and Drugs History Society (ADHS).
Para resolver essa situação crítica, ele propõe um modelo de regulamentação mais estrito, similar ao que existe em países como Canadá, Suécia e Uruguai, onde o Estado possui o monopólio na distribuição de bebidas alcoólicas em nível atacadista. Ele sugere que o Brasil implemente uma “Petrobras do álcool”, permitindo que toda a receita gerada seja direcionada para o orçamento público, contribuindo para áreas como saúde e educação, além de lidar com os custos relacionados ao uso excessivo de álcool.
“Esse modelo garantiria um controle rigoroso sobre a qualidade das bebidas, incluindo a supervisão sobre os horários e locais de venda, assim como a restrição de acesso ao público maior de idade”, argumenta Carneiro, ressaltando que isso poderia equilibrar déficits fiscais e proporcionar benefícios à sociedade como um todo. Segundo ele, as indústrias ligadas ao vício, como as apostas, também deveriam ser geridas pelo Estado, uma vez que a privatização atual não é benéfica.
A perspectiva histórica sobre a relação da sociedade brasileira com o consumo de bebidas alcoólicas é alarmante. A crise do metanol, que já resultou em pelo menos oito mortes e 148 notificações de intoxicação apenas até 15 de outubro, demonstra falhas no sistema de fiscalização e controle sanitário, com 30% das bebidas destiladas comercializadas clandestinamente. Carneiro critica a atual estrutura de regulação, que favorece grandes empresas internacionais, resultando em uma extração de renda que não retorna à sociedade.
O Desafio da Fiscalização e o Mercado Ilegal
A combinação de um modelo de regulação leniente com o aumento da produção clandestina e a conexão com o crime organizado, como o PCC, revela um quadro crítico. Recentemente, a Polícia Civil descobriu uma fábrica clandestina que adquiria etanol adulterado com metanol, levantando suspeitas de que o PCC estivesse envolvido na adulteração de bebidas. “O controle passa a ser não apenas uma questão fiscal, mas também sanitária”, destaca Carneiro, enfatizando que a falta de fiscalização resulta em produtos de baixa qualidade que colocam em risco a saúde pública.
Henrique Carneiro também se mostra favorável a um controle mais rigoroso do consumo público de álcool, com a possibilidade de restringir a venda de bebidas a horários específicos. Essas medidas poderiam ajudar a mitigar não apenas o consumo excessivo, mas também a violência e os incômodos sociais que surgem do uso descontrolado do álcool.
Ele defende que o Estado deve ter um papel ativo não só no controle da produção, mas também na regulamentação do mercado, de forma a garantir a segurança da população e reduzir os danos associados ao consumo excessivo de álcool. “Um modelo que prioriza o controle e a responsabilidade social pode ser mais efetivo do que deixar tudo nas mãos do mercado”, conclui Carneiro.
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