Dom Moacyr Grechi: Um Defensor da Justiça e do Evangelho
Em um contexto onde o silêncio prevalece como uma opção mais segura que a denúncia, Dom Moacyr Grechi decidiu se manifestar de forma impactante. Sua voz, reverberando desde as margens dos rios até os centros de decisão, tornou-se um marco para muitos no Acre, especialmente pela maneira como enfrentou as injustiças que cercam a vida na Amazônia. Agora, a história de sua fé e dedicação ganha um novo capítulo com o lançamento do livro “Uma Voz Profética na Amazônia”, escrito pelo irmão marista Sebastião Antonio Ferrarini, em celebração ao centenário da Diocese de Porto Velho.
A GAZETA teve a oportunidade de entrevistar Ferrarini, que compartilhou mais informações sobre o trabalho e as motivações por trás dele. Segundo o autor, a obra não é apenas um tributo, mas um memorial que provoca reflexões e, por vezes, desconforto. Embora faça parte das comemorações do aniversário da Diocese, foi no Acre, entre seringueiros, ribeirinhos e comunidades marginalizadas, que Dom Moacyr consolidou sua missão pastoral de maneira mais intensa.
“Dom Moacyr aprendeu com o povo e com as comunidades a viver um Evangelho encarnado”, afirma Ferrarini. “Ele se mostrou solidário com uma população há muito esquecida e oprimida, tornando-se porta-voz dos injustiçados”, acrescenta.
Uma Missão Marcada por Vínculos e Empatia
Durante mais de quarenta anos de missão, Dom Moacyr construiu laços significativos com ribeirinhos, seringueiros e habitantes das periferias. “Ele não apenas reconhecia a realidade; ouvia os apelos e caminhava ao lado dessas pessoas. Essa vivência iluminou sua prática cristã e suas orientações pastorais”, recorda Ferrarini. “Ele trouxe a atenção do Brasil e do mundo para essa região, fazendo uma leitura que contrastava com a visão do poder local”, destaca, lembrando que Dom Moacyr chegou à Amazônia em um período crítico da história brasileira, marcado por profundas transformações ocasionadas pelo Concílio Vaticano II e pelas Conferências dos Bispos.
“Esse novo impulso potencializou sua prática social e pastoral, incentivando as Comunidades Eclesiais de Base. Ele defendia uma fé viva, enraizada na realidade, promovia a ética na política e na economia, e se posicionava no Parlamento de Brasília contra o mandonismo local, a corrupção e as injustiças, além de ser um defensor ativo dos seringueiros e do bioma amazônico”, narra.
Ferrarini também ressalta que a postura de Grechi não passou despercebida. “Os temas abordados pelo Bispo frequentemente geravam incômodo. Mesmo diante de inúmeras ameaças, ele continuou firme. Uma de suas forças era o exemplo de Jesus, que também enfrentou violências e perseguições”, explica.
Um Legado de Coragem e Espiritualidade
Atualmente, os desafios que enfrentamos permanecem, além de novos obstáculos criados pela era digital. “Moacyr nos instiga a um contínuo discernimento e a uma conversão permanente. Uma vida cristã autêntica não pode ser dissociada da vida cidadã”, reflete Ferrarini.
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A obra, lançada pela Edições Paulinas com o apoio da Arquidiocese de Porto Velho, resulta de um processo de pesquisa minucioso. “Após revisar arquivos em Rio Branco, Porto Velho, Brasília e diversas bibliotecas, conseguimos alinhar os temas recorrentes que formaram os capítulos do livro”, destaca. “Sabíamos desde o início que não poderíamos deixar de abordar a missão pastoral de Dom Moacyr, seu envolvimento com ribeirinhos e seringueiros, suas denúncias contra corrupção e sua defesa pela Amazônia.”
Para Ferrarini, a obra revela que “uma pessoa que vive em profunda espiritualidade, como Moacyr, não se afasta das realidades humanas, mas se aproxima e as transforma em objeto de diálogo com Deus.” Ele conclui: “A Palavra de Deus ilumina a ação social, e esta enriquece a dimensão espiritual. Dom Moacyr foi um verdadeiro contemplativo em ação.”