Acre: A Nova Rota de Atendimento Médico em Fronteira | A Complexidade do Sistema de Saúde

Casos de Transferência Revelam Desafios de Saúde no Acre

A recente transferência de um bebê com cardiopatia grave de Pauini, no Amazonas, para tratamento em Manaus traz à tona a discussão sobre os desafios do sistema de saúde no Acre. O caso de Isadora, uma menina de sete meses que necessitava de uma cirurgia urgente, exemplifica as dificuldades enfrentadas por famílias que buscam atendimento médico especializado. A família percorreu mais de 267 quilômetros até Rio Branco, a capital do Acre, pois o acesso a Manaus só é possível por via aérea ou fluvial, o que torna a busca por assistência ainda mais complexa.

Diagnosticada com uma grave cardiopatia congênita, Isadora precisava de intervenção médica imediata. De acordo com a Secretaria de Estado de Saúde do Acre (Sesacre), a criança foi transferida para um centro especializado em Manaus na madrugada do dia 31 de outubro, onde permanece internada. O pai, Isaías Sobrinho, atualizou a situação e informou que ela está aguardando a cirurgia, programada para o dia 13, apesar de apresentar febre.

Esse episódio sublinha a complexidade dos fluxos de pacientes na Amazônia, onde as distâncias geográficas e a falta de infraestrutura adequada tornam o atendimento um verdadeiro desafio. Muitas vezes, a solução mais rápida para pacientes de estados vizinhos não é dentro de suas próprias fronteiras.

Atendimentos de Pacientes de Estados Vizinhos

Dados fornecidos pela Sesacre mostram que, apenas entre janeiro e outubro deste ano, quase 50 pacientes oriundos de cidades do Amazonas receberam tratamento no Acre. A maioria vem de municípios como Envira e Pauini, que enfrentam dificuldades semelhantes em seus próprios sistemas de saúde. A coordenadora estadual do Samu no Acre, Necila Fernandes, destacou que muitos pacientes chegam sem ter sido previamente regulados, o que dificulta a coleta de dados sobre o fluxo de atendimento.

“Estes são os casos que o Samu tem ciência. Porém, vem muito mais [pacientes] que ficam em casas de apoio fazendo tratamento nas unidades da capital”, afirmou Fernandes, enfatizando a necessidade de melhorar a regulação e o acompanhamento desses pacientes.

A distância entre Rio Branco e Pauini chega a 270 km, e o acesso a Manaus pode levar dias, dependendo das condições de transporte. Essa situação leva muitas famílias a optarem por buscar atendimento no Acre, onde a infraestrutura hospitalar é relativamente melhor, especialmente em cidades como Cruzeiro do Sul e Sena Madureira.

Questões de Regulação e Responsabilidade

Além das dificuldades enfrentadas pelas famílias que buscam atendimento, a questão da responsabilidade no cuidado dos pacientes que vêm de outros estados é outra preocupação. Muitas vezes, a responsabilidade pelo atendimento se torna um jogo de empurra entre as esferas de saúde dos estados, especialmente em casos onde a transferência é necessária. Fernandes destacou que não há mecanismos de cooperação existentes que facilitem o atendimento de pacientes vindos de outros estados, o que pode resultar em um agravamento da saúde desses indivíduos.

A situação é ainda mais complicada para pacientes que vêm de países vizinhos, como Bolívia e Peru. Recentemente, um adolescente boliviano sofreu um acidente em Epitaciolândia e foi transferido para o Pronto-Socorro de Rio Branco, mas faleceu após 17 dias. A falta de um protocolo claro para o atendimento de pessoas de fora do Brasil, mesmo sendo o SUS um sistema universal, representa um desafio adicional.

Necila Fernandes fez um apelo ao Ministério da Saúde, pedindo a criação de mecanismos que considerem as particularidades das regiões de fronteira. “Às vezes, esses pacientes são gravíssimos e são simplesmente colocados em um avião sem a presença de profissionais de saúde, o que é inaceitável”, concluiu. O Acre, portanto, continua a ser uma importante ponte para o atendimento de saúde de moradores do interior do Amazonas e de outros estados e países, em um sistema que clama por colaboração e eficiência.