Aos 24 anos, Angélica Nunes da Silva Manchineri se destaca como a primeira indígena do acre a ser aceita no curso de medicina da Universidade Federal do acre (ufac). Representando os povos Manchineri e Huni Kuî, Angélica garantiu sua vaga através do Processo Seletivo Específico para Estudantes Indígenas, uma iniciativa que ofereceu duas oportunidades para o tão desejado curso. Esta conquista é um marco significativo na trajetória da ufac, que já conta com mais de cinco décadas de história, e é celebrada por ser um símbolo de resistência, superação e vitória coletiva dos povos originários.
O Coletivo de Estudantes Indígenas da ufac (CEIUFAC) enfatizou a importância dessa conquista, ao afirmar que “a universidade é amazônida e também é território indígena. História viva em movimento”. Essa afirmação ressalta a relevância da inclusão indígena no ensino superior e a necessidade de um espaço que respeite e valorize as culturas originárias.
A trajetória de Angélica até o ingresso na medicina não foi fácil. Em 2020, ela iniciou sua caminhada acadêmica em Engenharia Civil, por meio do Programa Universidade para Todos (Prouni). Contudo, seu sonho foi interrompido em 2023, quando a instituição de ensino particular encerrou suas atividades. Mesmo diante desse obstáculo, Angélica mostrou resiliência e decidiu tentar novamente o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Em 2024, ingressou em Engenharia Elétrica, e, no ano seguinte, retornou à Engenharia Civil. Durante esse intervalo, surgiu o edital específico da ufac, que se tornou uma nova oportunidade.
“Dediquei um mês inteiro aos estudos na biblioteca da ufac. Fiz resumos, realizei leituras, mas percebi que a prática através de exercícios era o que realmente me ajudava. Quando vi meu nome na lista dos aprovados, foi um momento surreal. Era o curso mais concorrido”, compartilhou Angélica, refletindo sobre sua jornada.
Para ela, essa conquista vai além do sucesso pessoal; é um triunfo que representa a luta e a força de seu povo. “É uma honra imensa. Essa vitória é um testemunho da resistência dos povos indígenas. Prova que nós, como originários, temos voz, talento e a capacidade de ocupar todos os espaços que desejarmos”, afirmou.
Angélica também abordou os desafios que enfrentou ao longo de sua trajetória, mencionando a precariedade no sistema de educação básica, a falta de transporte adequado e a insuficiência de infraestrutura nas escolas. Apesar de todas essas dificuldades, sua motivação sempre foi alimentada pela ancestralidade e pelo senso de coletividade. “Não cheguei sozinha; carrego a força dos povos indígenas comigo”, declarou.
Em uma mensagem inspiradora para os jovens indígenas que almejam ingressar no ensino superior, Angélica enfatizou a importância da dedicação e da ambição. “Não se contentem apenas com a esperança de que tudo dará certo. Tenham a determinação de conquistar essa vaga. Estudem até terem a certeza de que ela é sua. Persistam, pois haverá críticas e desafios, mas lembrem-se: entrar em uma universidade federal é para aqueles que lutam”, aconselhou.
Por fim, Angélica deixou uma mensagem poderosa à sociedade: “Que essa conquista seja vista não como um feito isolado, mas como um avanço coletivo em direção a uma sociedade mais justa e inclusiva. A presença indígena nos ambientes acadêmicos é legítima e necessária. Que o conhecimento tradicional e o científico possam coexistir em harmonia, sempre com dignidade, empatia e união.”
Essa trajetória não apenas ilumina o caminho de Angélica, mas também serve como um farol de esperança e inspiração para muitos outros, demonstrando que a luta pela educação e inclusão é um passo crucial para a valorização da cultura indígena e para a construção de um futuro mais equitativo.