Uma Nova Configuração Política na Bolívia
A contagem de votos realizada no último domingo trouxe à tona um novo cenário político na Bolívia. O senador Rodrigo Paz Pereira, do Partido Democrata Cristão (PDC), emergiu como o vencedor, com cerca de 31,7% dos votos. Esta vitória sinaliza uma mudança significativa, já que o partido de esquerda, o MAS (Movimento ao Socialismo), perdeu sua hegemonia, que perdurou por quase duas décadas. A disputa presidencial, marcada por dois candidatos de Direita, Paz e Jorge “Tuto” Quiroga, reflete um desempenho enfraquecido da esquerda no país.
A primeira fase das eleições, realizada em 17 de setembro, já indicava um recuo do MAS ao deixá-lo de fora do segundo turno, punido pela fragmentação interna entre o ex-presidente Evo Morales e o atual mandatário, Luis Arce. Além disso, a intensa crise econômica que atinge a Bolívia contribuiu para este cenário de descontentamento. A insatisfação popular resultou em uma expressiva quantidade de votos nulos, que chegou a quase 20%, resultado da convocação de Morales para que os bolivianos não apoiassem os candidatos em disputa.
Desafios Econômicos e Políticos na Bolívia
A situação socioeconômica da Bolívia é alarmante, caracterizada por um crescimento econômico estagnado, registrado como o mais fraco da América Latina, conforme dados da CEPAL (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe). A escassez de dólares, provocada pela queda nas exportações de gás, e uma inflação em alta estão afetando a vida dos bolivianos. Diante deste contexto, o principal partido de esquerda do país, o MAS, viu-se dividido por disputas internas, o que culminou em seu enfraquecimento ao longo dos anos.
O ex-presidente Evo Morales, que governou entre 2006 e 2019, se afastou da política institucional e, ainda assim, sua influência permanece. O professor de Relações Internacionais da PUC-SP, Arthur Murta, observa que a quantidade de votos nulos representa uma parte significativa do eleitorado que ainda é mobilizada pelo ex-líder. Com a saída de Morales da disputa e a recusa de Arce em buscar a reeleição, ficou mais evidente o espaço para a ascensão da Direita na política boliviana.
Ascensão da Direita e Impactos na Política Brasileira
Os resultados das eleições na Bolívia provocaram reações entre políticos brasileiros da ala conservadora, que enxergaram uma possível previsão do que pode ocorrer nas eleições de 2026 no Brasil. O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), expressou otimismo em relação ao resultado, esperando que o Brasil siga o exemplo da Bolívia. Já o senador Ciro Nogueira (Progressistas) comparou a situação política da Bolívia com o PT (Partido dos Trabalhadores), sugerindo que “a Bolívia é o Brasil em 2026”.
Por outro lado, a deputada federal Caroline de Toni (PL) afirmou com convicção que o resultado na Bolívia representa uma “onda de mudança” na América Latina. Contudo, especialistas advertem que o cenário político na região é muito mais complexo e diverso do que uma simples equivalência entre as eleições boliviana e brasileira. A professora de Relações Internacionais da Unifesp, Regiane Bressan, enfatiza que a América do Sul atravessa um período de alternância de poder, com governos de diferentes espectros ideológicos coexistindo.
Comparações Entre os Cenários Políticos
Embora existam semelhanças entre as realidades sociais e históricas da Bolívia e do Brasil, o professor Arthur Murta acredita que não é prudente traçar paralelos diretos entre as eleições boliviana e a futura disputa no Brasil. Ele destaca que, diferentemente do MAS, que se fragmentou, o movimento progressista brasileiro permanece unido em torno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Esse fator, segundo Murta, é crucial para a diferenciação dos contextos políticos dos dois países.
Regiane Bressan acrescenta que a insatisfação popular em relação à política tradicional, combinada com a instabilidade econômica e novas demandas sociais, tem levado os eleitores a buscarem alternativas fora dos padrões ideológicos convencionais. Essa dinâmica, segundo ela, transforma a América Latina em um “mosaico” governamental, onde as respostas populares ao descontentamento não devem ser ignoradas.